Salmonelose e salmonela em Répteis - Atenção e cuidados
Devido a uma reportagem publicada no dia
12 de março de 1997 no jornal O GLOBO (RJ), sobre o recente surto de
salmonelose em pessoas relacionadas com a criação de répteis em cativeiro nos
EUA, tenho recebido regularmente telefonemas de pessoas aqui no Brasil que
compraram animais e estão apreensivas quanto ao potencial de transmissão da
doença entre as pessoas, portanto tentarei explanar algumas observações a
respeito do assunto. Os dados emitidos nesta matéria estão baseados em
informações científicas, cujas referências estão em seguida, entre parênteses.
Para qualquer informação extra, dúvida ou sugestão, faça contato comigo.
Salmonella é um gênero extenso de
enterobacteriáceas, ou seja, bactérias encontradas normalmente no trato
gastrintestinal de insetos, aves, mamíferos e répteis. No caso de répteis,
estão comprovadamente envolvidos os iguanas (Frye, Frederic L., 1995) e outras
espécies de lagartos (Hinshaw, W.R. and McNeil, 1974), e serpentes (Hinshaw,
W.R. and McNeil, 1994). De acordo com Martin Toly, epidemiologista do New York
Departament of Health, também foi constatada em monitores (lagarto) e pítons
(serpente).
Os sintomas incluem febre, dor estomacal,
náuseas e diarréia, além de vômitos. Pode causar um quadro de gastroenterite e,
caso se estabeleça na corrente sangüínea, causa septicemia (infecção
generalizada), meningite, encefalite e osteomielite, podendo levar à morte.
Mesmo que um animal carregue a bactéria,
apenas uma minoria dos 2.000 sorotipos conhecidos da mesma pode ser perigosa
para seres humanos, e entre elas, apenas a Salmonella typhi pode
ser transmitida de pessoa para pessoa (Miller et al, 1995).
De qualquer forma, há poucas chances de
seres humanos em estado físico normal contraírem a doença, que atinge mais
facilmente crianças de idade inferior a seis anos, os idosos e as pessoas
imunossuprimidas, ou seja, com doenças como o câncer, tuberculose ou a AIDS. Um
fator muito importante para o controle da doença consiste em se observar
medidas básicas de higiene, como o simples ato de lavar as mãos depois de
manipular qualquer tipo de animal, inclusive cães e gatos domésticos.
Apesar da transmissão ser dificultada por
todas as barreiras acima descritas, não se deve ignorar a possibilidade de
contágio, pois, apesar de mínima, há chance da doença acontecer e uma pequena
porcentagem de pessoas contaminadas virem a falecer. Em um estudo feito em 1991
por Miller de casos de Salmonella em seres humanos, entre 12.748 casos
registrados, 49 foram fatais, ou seja, 0,38%, uma percentagem pequena, mas significante.
As primeiras relações entre Salmonella
e répteis foram observadas no início dos anos 70. Desde esta década até hoje
pesquisadores observaram cerca de 250.000 a 300.000 casos de salmonelose
adquiridos pelo contato com tartarugas verdes (vide Frye; Volk et al.), o que
levou em 1975, a U.S.F.D.A., agência governamental americana responsável pelo
controle de qualidade de medicamentos e alimentos, a vetar a venda de
tartarugas aquáticas menores de quatro polegadas (10 cm), tamanho onde era possível
que as crianças pudessem colocá-las na boca, vindo a contrair a doença,
prevenindo uma possível contaminação de 100.000 casos anuais, estimativa da
própria agência.
De acordo com Martin Toly, apenas uma
pequena percentagem (10% de casos) de salmonelose em seres humanos está
relacionada com répteis nos EUA, portanto, nós devemos nos preocupar muito mais
com a Salmonella transmitida por verduras e frutas, carne bovina e
principalmente frango, ovos, queijo e leite contaminados, artigos que adentram
bem mais facilmente em nossas casas do que a Salmonella
transmitida por répteis, cuja manipulação deve obedecer a regras óbvias de
higiene.
No Brasil, não é artigo raro nos jornais
casos de infecção alimentar causada por Salmonella em
restaurantes e presídios, devido à contaminação na alimentação, que pode ter
acontecido em determinado produto (por exemplo, ovos contaminados na própria
granja) ou na hora do processamento da comida, por falta de higiene na hora do
preparo. Apesar disto, fatos como estes passam com pouca notoriedade pela
maioria do público, o que não acontece no caso de animais ditos como
"diferentes" por certas pessoas (tentando ser brando, ao colocar a
opinião da maioria das pessoas a respeito de répteis).
O parágrafo anterior não exime de responsabilidade
as pessoas que têm contato direto ou não com répteis, mas visa retirar uma
possível sensação de alarme que matérias de jornal possam infundir, de forma
intencional ou não, pois as pessoas que me contatam geralmente se mostram bem
assustadas com a hipótese de contrair a doença.
A
terrariofilia no Brasil está começando e deve acontecer de forma inteligente e
baseada em pesquisa científica para que haja evolução. Às pessoas que me
procuram antes da aquisição de serpentes ou iguanas procuro explicar que este
tipo de atitude requer um certo grau de responsabilidade. Criar répteis requer
respeito e pesquisa por parte da pessoa interessada, pois são animais “Tabus”
para a maioria das pessoas. Nunca se deve sair à rua com seu iguana de
estimação porque você sabe que não há risco para ninguém. As pessoas têm medo
e, irracional ou não, este deve ser respeitado.
As informações aqui contidas não saíram
apenas do que eu entendo a respeito de Salmonella, seja em
répteis e outros animais, bem como em produtos alimentícios industrializados ou
in natura. São partes de artigos publicadas em periódicos especializadas em
herpetologia, bem como material coletado em homepages especialmente preparadas
para educar as pessoas sobre o problema. Caso haja necessidade de outras
informações, contate me, procure veterinários especializados em zoonoses,
dentro de centros municipais, bibliotecas e outras fontes de informação
confiáveis. Analise e pese as informações obtidas e daí desenvolva seu próprio
ponto de vista, firmado em esclarecimentos obtidos de fontes confiáveis. Abaixo
vão mais medidas úteis. Leia com atenção e passe adiante aos interessados:
Pessoas que não devem manter contato com répteis:
- Bebês e
crianças abaixo de cinco anos de idade.
- Qualquer
indivíduo que porte doença que afete negativamente o sistema autoimune
(HIV/AIDS, Câncer, etc.).
- Qualquer
indivíduo que esteja sob terapia de rejeição ou sob período pós-cirúrgico.
- Pessoas sob
terapia supressora do sistema imune (quimioterapia, radioterapia, corticosteróides,
modificadores biológicos, etc.).
- Mulheres
grávidas, devido ao risco latente de contaminação fetal.
- Idosos,
convalescentes e pessoas em baixo estado nutricional.
Medida óbvia -
Após manejar animais de terrário ou equipamento relativo, lavar bem as mãos com
sabão, ensaboando por 30 segundos e enxaguando com bastante água. Dê
preferência a um sabão antibacteriano. Lavar somente com água é ineficaz contra
Salmonella.
- Répteis, bem
como demais animais da casa, devem ser mantidos à distância da cozinha ou de
locais onde seja preparada alimentação ou esta seja armazenada/servida.
- Não use material de cozinha para limpar objetos relacionados a répteis
e demais animais. Caso se prepare alimento para animais, estes devem ser
preparados em vasilhames da cozinha e depois levados ao local do terrário, onde
devem ser despejados na vasilha dos animais, estritamente sem contato.
- Não coma enquanto cuida dos animais e dos terrários. É
ANTI-HIGIÊNICO!
- Mantenha o terrário e demais materiais sempre limpos, pois
higiene é fundamental para eliminar não só Salmonella, mas todos os tipos de
bactérias.
- Crianças com menos de 12 anos devem ser sempre supervisionadas
enquanto manuseiam répteis, pois não devem beijar ou levar a mão à boca
enquanto estiverem em contato com os mesmos. Além disso, répteis precisam ser
manipulados com respeito e cuidado.
- Educar as crianças sobre medidas de higiene. Répteis são ótimos
para se educar a respeito de lavar mãos e não as colocar na boca, além da
função de educação ambiental.
- Não manuseie répteis se você estiver com feridas e machucados ou
cortes nas mãos. Luvas de manipulação são facilmente compradas em farmácias e
lojas de artigos hospitalares. São baratas e úteis até para limpeza de outras
fontes de contaminação, como pias e banheiros, onde os riscos de contaminação
são bem maiores que os oferecidos pelo seu lagarto.
- Caso seja necessário utilizar boxes sanitários para terminar a
limpeza do terrário ou dar banho em seus animais, desinfete o local depois com
água sanitária ou soluções bactericidas comerciais.
Vale ressaltar que:
Répteis não combinam definitivamente com pessoas irresponsáveis,
anti-higiênicas, exibicionistas e ignorantes. Ignorância é um fator limitante
para 99% das atividades humanas comuns, sendo, com certeza, imperiosamente
desnecessária na correta manutenção de répteis em cativeiro.
Rotas de transmissão outras fontes de Salmonella:
- A forma mais comum de se adquirir Salmonella é a
ingestão, ou seja, por via oral.
- Feridas e cortes ou demais machucados nas mãos.
- Respingos de água contaminada nos olhos e boca.
- Inalação de aerossóis, portanto a aeração de ambientes é
necessária. Antes que os leitores se levantem eu explico, terrários tropicais
devem ter umidade alta e ventilação também, como o restante dos aposentos. Isto
é essencial para a correta manutenção de seus animais, pois a umidade alta
favorece aumento de microrganismos. Um ambiente adequadamente ventilado deve
ser borrifado com água constantemente.
- Fezes de animais são fontes constantes. Limpe imediatamente.
- Alimentos mal cozidos são fontes de contaminação! Cuidado com
carne de frango, bovina, suína, leite, queijo e ovos.
- Restaurantes suspeitos quanto às condições de higiene devem ser
evitados. Evite maioneses e verduras cruas em bancas de cachorro quente.
- A terra contém as mais variadas cepas de bactérias e fungos.
Evite mexer com terra, caso mexa, lave as mãos imediatamente.
Como foi observado, 90% do que está escrito acima não é novo para
você. Você já deve ter ouvido a maioria das coisas acima descritas pela sua
própria mãe, pois são regras básicas de higiene, regras estas muitas vezes
ignoradas, gerando alto índices de contaminação bacteriana e verminótica nas
pessoas das mais variadas classes sociais, o que já não é notícia nos jornais
por aqui. Mas a recente entrada no comércio dos répteis e anfíbios começa a ser
notícia difundida e devido à natureza dos animais e falta de informação de
grande parte do público, pode causar transtornos desnecessários às pessoas
engajadas em trabalhos sérios nesta área.
Referências:
* Reptiles and Amphibian Magazine
* Reptiles Magazine
* Aquarium
* Tropical Fish Hobbyist
Ademar Couto
Médico Veterinário
https://ademarcouto.wixsite.com/ademarcoutovet
https://ademarcouto.wixsite.com/ademarcoutovet
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